terça-feira, 25 de setembro de 2007

E o vento levou...

Quando o exército alemão usou armas químicas pela primeira vez durante a Grande Guerra de 1914-1918, o alto-comando inglês reagiu com indignação:

É uma forma covarde de guerra que não pode ser elogiada nem por mim, nem por nenhum soldado inglês... Não podemos ganhar essa guerra a não ser que matemos ou incapacitemos mais inimigos do que eles o façam a nós e, se isso só pode ser feito copiando a escolha de armas feita por nosso inimigo, não podemos nos recusar a fazê-lo. (ten. gen. Ferguson, comandante do II Corpo)

Assim, em 25 de setembro de 1915, as tropas britânicas avançaram sobre as trincheiras germânicas sob nuvens de cloro gasoso. O ataque foi um fracasso. O vento estava fraco e as nuvens venenosas se formaram sobre a terra de ninguém, atrapalhando o ataque e, em alguns trechos, foram sopradas de volta para as trincheiras de origem. Não obstante, a Força Expedicionária Britânica foi responsável pelo maior número de ataques com uso de gás venenoso dentre todos os combatentes.

Ao final da guerra, uma comissão foi montada para discutir as regras da guerra moderna. O relatório da subcomissão encarregada da organização da guerra química dizia:

O comitê não tem a menor dúvida de que o gás é uma arma legítima na guerra, e considera que se pode desde já prever que será usado no futuro, pois a história não registra nenhum caso de uma arma comprovadamente útil na guerra ter sido abandonada por nações que lutam pela sobrevivência.

Apesar disso, um tratado foi concluído em 1925 proibindo o uso de armas químicas e bacteriológicas, logo ratificado pela maior parte dos combatentes da Grande Guerra (os EUA e o Brasil só o assinaram na década de 1970). Até lá, o gás já havia sido usado diversas vezes como arma, mas apenas em batalhas coloniais, quando havia uma grande diferença tecnológica entre os combatentes e as armas químicas podiam ser mais eficazes.

Com a chegada da Segunda Guerra Mundial, o uso de gases tóxicos era dado como certo por todos os lados no conflito. Todos os países estocaram armas químicas e máscaras anti-gás, mas apenas poucos casos isolados foram relatados e os países responsáveis trataram imediatamente de se desculpar pelos incidentes, garantindo ter se tratado de acidentes. Após 1918, o gás viu uso intensivo como arma de guerra apenas na guerra Irã x Iraque (1980-1988), quando cerca de 20 mil soldados iranianos morreram envenenados pelos ataques químicos de seus adversários (cerca de 1/4 do número de mortes causado pelas armas químicas na guerra de 1914-1918).

Talvez a história do uso do gás seja a história do uso da bomba atômica. Ao contrário do gás, desde o início a bomba se mostrou eficiente como arma. Talvez, até, eficiente demais. Como arma de dissuasão, toda a Guerra Fria foi a era da guerra atômica. Mas a atual situação política não é favorável ao uso da bomba atômica como arma de guerra (o que, claro, não exclui a possibilidade de terrorismo nuclear; veja o excelente documentário Sob a névoa da guerra). Luis Fernando Veríssimo, em uma crônica particularmente inspirada, escreveu uma vez:

O símbolo trágico do século foi o físico Robert Oppenheimer, um dos pais da bomba atômica, que depois se recusou a colaborar no desenvolvimento da bomba de hidrogênio, num dos raros momentos do século em que o remorso alcançou a ciência e Fausto pediu sua alma de volta.

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